Peraltice

Anos 70. Eu estudava no Colégio Central na época (bons tempos), 3º ano do ensino médio e, como toda adolescente, tinha uma turminha dos quais só tenho notícia de um atualmente. Nas aulas vagas, o que era muito comum, ficávamos reunidos inventando o que fazer para “matar o tempo”.

Num desses dias um colega contou que um mendigo cuja perna tinha uma enorme ferida e esmolava próximo era um grande mentiroso. Disse que viu o tal homem, que aparentava uns 30 anos mais ou menos, retirar um pedaço de carne (um bife) da perna e jogar fora. A perna era perfeita! O que o homem fazia era uma maquiagem! Como isso? Ele deixava o bife sobre a perna e passava uma bandagem em torno, simulando uma ferida aberta. Ficava perfeito. Aos poucos, durante o dia, insetos iam se aglomerando e o resultado de fato era algo muito repugnante. As pessoas se condoíam e davam esmolas que ele recolhia numa cuia de queijo, gemendo e com cara de quem sentia muita dor.

A princípio todos ficaram incrédulos, como era possível? E eu tive uma ideia: “Vamos desmascarar o ordinário!”. E contei o que pretendia...

Iríamos passar, em grupo, próximo ao mendigo e um de nós pisaria na perna doente do homem, em seguida deveríamos correr. Alguns ficaram com medo, mas instiguei o grupo e dois dias depois consegui por em prática o que pensei.

Assim fizemos. Viemos caminhando lentamente, sem medo nenhum, ao chegarmos perto (não me lembro quem) pisou bem em cima da ferida na perna estendida do homem. E... Corremos! Mais distante, próximo a um ponto de ônibus, paramos ofegantes e ficamos observando.

O safado levantou-se, começou a correr, a bandagem caiu, o pedaço de bife ficou no chão. Começamos a rir. Entramos na escola. Nunca mais vimos o tal mendigo na área.

Hoje em dia fica a pensar: e se fosse mentira do colega? E se fosse mesmo uma ferida?

Adilma